sexta-feira, 5 de junho de 2009

O PRIMEIRO DISCO A GENTE NUNCA ESQUECE*


Não lembro quantos anos eu tinha. Talvez uns seis, no máximo oito, o que corresponderia ao ano de 1984 ou 1986, por ali... Lembro-me de ter admirado o KISS, que passou pelo Brasil em 83. Aquelas caras pintadas aliadas ao som “diferente” exerceram em mim algum tipo de fascinação.

Bom, estamos então nos idos de 1984 e eu era apenas uma criança que gostava de brincar de playmobil. Um dia entra no quarto um cara dizendo que tinha um presente pra mim. O cara era o então namoradinho da minha irmã: “Ricardão, esse é pra você!”

Parêntese. Como toda criança, eu adorava ganhar presentes. Eu gostava tanto, que pedia pra minha mãe embrulhar os brinquedos antigos em papel de presente e me dar de novo. Várias vezes. Era sempre aquela emoção! Fecha parêntese.

Dessa vez o presente não era um playmobil. Era um disco. Fosse um CD, o episódio não teria o mesmo impacto, ainda mais com aquela enorme capa sangrenta (imagem). “If You Want Blood, You Got It” – AC/DC. Lembro do cheiro peculiar daquele disco. Estaria mentindo se dissesse que o coloquei pra tocar na hora e me apaixonei de imediato pelo som daqueles poderosos riffs de guitarra, mesmo porque eu era proibido de mexer no som - um 3 em 1 da Polyvox – mas a lei foi feita pra ser quebrada. Até então a trilha sonora de minha infância solitária (sem qualquer pieguice – sou temporão, meus irmãos são 11 e 12 anos mais velhos) era composta pelas músicas do Balão Mágico.

É. Um dia, porém, eu peguei a bolacha e botei pra tocar. Antes desse disco, eu nem ligava pro som, ouvia os discos da musa Simony e olhe lá. Depois dele, contudo, passei a fuçar os discos dos meus irmãos em busca daquele som diferente (agora sem as aspas). O critério de seleção era inocente: a capa. E a partir daí eu já não “tinha” mais só os discos do Balão Mágico.

Valendo-me desse critério precário (mas, de certa forma, eficaz em se tratando de rock and roll) topei com "Uns" (é ver a capa e descartar) e uns outros do Caetano Veloso, coletâneas de Nelson Gonçalves, discos de cantoras que iam de Amelinha a Maria Bethania, mas também com coisas de raro apuro, como Camisa de Vênus e Black Sabbath!

Certo. Todos vão concordar que, se o critério de seleção era a capa, impossível não ficar magnetizado pela de Sabbath Bloody Sabbath, assim como fiquei quando ganhei de presente aquele disco que mostra Angus de gravatinha perfurado pelo braço da guitarra. Do outro lado, na contracapa, o guitar hero de bruços com o mesmo braço de guitarra fincado em suas costas, deixando ver que o instrumento transpassara seu corpo. Igualmente sinistra é a contracapa desse disco do velho Sabbath que a exemplo de "Blood" também dialoga com a capa.

“Sabbath Bloody Sabbath”, quinto disco dos pais do metal, além das já citadas capa e contracapa, além da faixa título traz pérolas como a romântica (só na letra) Sabba Cadabra, que conta com a participação do tecladista Rick Wakeman, do Yes, apesar da faixa não passar nem perto do que se costuma chamar de rock progressivo.

“If You Want Blood, You Got It” – AC/DC, apesar de ter sido o meu primeiro disco, foi o último disco com Bon Scott (me amarro no Brian Johnson, mas o Bon é melhor – perdoado o trocadilho) e reune músicas dos primeiros discos da banda australiana num show gravado em 30 de Abril de 1978, em Glasgow, Escócia. Destaque para The Jack, quando Scott pergunta à platéia: “Any virgins in Glasgow?”, isso é a cara do AC/CD. Enquanto o disco novo não sai – Black Ice tem previsão de lançamento para o dia 20 de Outubro deste ano – ouçamos os clássicos dessa fantástica banda.

O primeiro disco a gente nunca esquece, ainda mais quando ele abre as portas para um mundo novo. Consciente ou não, aquele cara - enxadrista de mão cheia e, se não perverso, no mínimo capcioso - acendeu o pavio e o rock and roll passou a morar lá em casa. Volumes ainda tímidos, pra não esculhambar. Mas algum vizinho pediria pra aumentar...

*coluna originalmente publicada em www.malditafutebolclube.blogspot.com em 23 de Agosto de 2008

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